Outro dia me peguei pensando nisso, nesse tal de jogo de filha e mãe. Não é um jogo de tabuleiro, claro, nem de videogame. É mais aquela dança estranha que a gente vive, sabe? Uma hora você é a filha que obedece, outra hora é a que bate o pé. E a mãe? Ah, a mãe também tem as fases dela nesse jogo.

Lembro bem de quando eu era pequena. O jogo era simples: eu fazia o que mandavam, ganhava um sorriso. Desobedecia, cara feia. Regras claras, né? Parecia fácil, mas já ali eu sentia que tinha algo mais, umas regras não ditas. Tipo, não podia questionar muito, tinha que adivinhar o que ela queria. Era um jogo de adivinhação às vezes.
Aí veio a adolescência. Nossa! O tabuleiro virou, as peças mudaram de lugar. Eu comecei a querer mudar as regras. Queria jogar do meu jeito. Foi uma fase complicada, cheia de conflito. Parecia que a gente estava em times opostos. As regras não ditas ficaram mais tensas:
- Não me critique na frente dos outros.
- Me deixe ter meus segredos.
- Entenda que eu cresci.
- Mas ainda cuide de mim (só quando eu quiser).
Que confusão! A gente brigava, fazia as pazes, brigava de novo. Era um empurra-empurra danado. Tentar entender o lado dela era difícil, e pra ela entender o meu, parecia impossível às vezes. Teve muita porta batida, muita lágrima escondida. Foi um período bruto, de aprender na marra como jogar essa nova versão.
Demorou, viu? Demorou pra gente achar um ritmo novo. Fui morar sozinha, ganhei minha independência. Isso ajudou. A distância deu uma perspectiva diferente. Comecei a ver ela não só como ‘mãe’, mas como mulher, com a história dela, os problemas dela. Ela também começou a me ver mais como adulta, eu acho. O jogo ficou menos sobre ganhar ou perder, e mais sobre… coexistir?
E hoje, como tá esse jogo?
Olha, ainda tem dias que a gente escorrega nas regras antigas. Ainda tem umas faíscas. Mas é diferente. Hoje a gente conversa mais, tenta se entender. Tem dia que eu sou mais filha, pedindo colo, conselho. Tem dia que sou mais amiga. Tem dia que até parece que os papéis se invertem um pouco, eu cuidando dela.

Não sei se esse ‘jogo’ acaba algum dia. Talvez não. Talvez seja só isso mesmo: ir ajustando as regras, aprendendo a jogar juntas, mesmo quando uma quer mover a peça pra esquerda e a outra pra direita. É complexo, cansativo às vezes, mas também tem um valor que só quem joga entende. No fundo, a gente só quer continuar na mesma partida, né?